segunda-feira, 29 de março de 2010
São Paulo, 29 de março de 2010.
Olá, querido!
Como está?
Hoje a sobremesa no horário de almoço foi um novo livro de cartas de Clarice Lispector. Senti-me um tanto intrusa ao folhear as cartas que ela trocava com o marido, então namorado, Maury, nos idos de 1940. Pensei que ela talvez não esteja gostando de ver sua intimidade exposta em livrarias, ainda que seus livros sejam o retrato mais íntimo de sua alma.
Senti saudade dos selos. O papel guarda as digitais, o cheiro, a tinta borrada, a irregularidade da letra denunciando sentimentos. O selo é a espera. Sabe-se o dia e o horário que o carteiro passa. Quantas vezes aguardei o carteiro com um sorriso, às 3 da tarde, no portão de casa...Os carteiros são hoje mais solitários.
Voltando a Clarice, curioso ler que há setenta anos o então namorado, diplomata, já se queixava do trabalho burocrático e do relógio que andava tão apressado. A angústia do tempo é sempre hoje.
Mas nada como as cartas que trocavam ela e Fernando Sabino. Almas gêmeas na inquietude, na gentileza, na poesia, ao menos foi o que me pareceu. Na última frase da carta, Fernando dizia: por favor, escreva-me uma carta de sete folhas, Clarice!
Eu saí da livraria extasiada e vim correndo escrever esta carta aqui.
Beijo e saudade.
Tua,
Débora
foto: Fernando e Clarice
domingo, 28 de março de 2010
Toalha rendada
O sofrimento produz manifestações de amor. Mais do que a alegria. Não diminuindo o sorriso mas entendendo o porquê da lágrima.
Minha mãe está com problemas de saúde. Há seis dias.
Meu pai quer arrancar-lhe a dor com as mãos: culpa os médicos, vasculha novos endereços de consultórios no catálogo, conta os comprimidos da caixinha como se sua esperança fosse sendo descartada a cada cápsula .
Fica mal-humorado, mais do que ela, pela impotência de solucionar. Diz que a dor foi
causada pela cadeira que mal acomodou o nervo ciático, busca o motivo que os médicos não encontraram. Seu movimento de amor sempre foi pela providência. Ele não vai dar um conselho ou abraço. Ele vai providenciar o almoço, vai comprar três pomadas, ele vai trocar a poltrona do quarto.
Pensei no casamento. Uma toalha branca rendada. Tecida a mão, juntam-se circunferências num meticuloso bordado. Às vezes deixa-se de tecer por um tempo, por preguiça ou por cansaço, pela mesmice do trabalho, mas unindo-se desenhos e formatos, tece-se no decorrer de uma vida, um longo retrato. Pontos apertados e largos, movimentos lentos e rápidos, constantes e esporádicos...
Sei que por fim, a mesa posta, deve ser acolhedor dividir esta toalha, que ornamenta o alimento, servido para dois, agora, num tempo novo de vida antiga, de mesa grande e poucos pratos, de rugas, carinho e estrada.
arte: Marc Chagall
sábado, 27 de março de 2010
O AMOR
sexta-feira, 26 de março de 2010
Nem tudo se pode prever
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