quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Seu coração no meu


Uma hora. Seu sono deveria ter avançado com a noite mas você desperta, Não tem hora para celebrar a vida. Vida nova.

Eu deito você em minhas pernas, seguro sua cabecinha com as duas mãos e nossos olhos iniciam uma conversa.

Seus olhos falam comigo, intensos, dentro dos meus.

Eu esqueço-me da hora, do cansaço. Nossa primeira conversa, de muitas que virão.


Inclino-me ao perfume de seus cabelinhos, beijo sua testa.
Boa noite, meu amor.




(arte: Juan Miró)

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

terça-feira, 7 de dezembro de 2010


"Se o fim fosse bom, não seria fim,
seria começo"

(do filme "Divã")



foto: Haruo Ohara

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Felicidade Conjugal


Um livro curto e intenso. Como um bom poema.
"Felicidade Conjugal", do mestre Tolstói, não me traz palavras à boca. Suas palavras gravam-se no espírito. Não somente pela genialidade de sua linguagem, mas pela sinceridade de sua alma de escritor. E que outro atributo, melhor do que este, pode ter aquele que maneja palavras?
Tolstói penetra no universo feminino como se a ele pertencesse. E pertence, pois aqui está. Mergulha no desejo, na angústia, na fragilidade e na força da mulher.
Sua obra é atemporal pois ainda está muito à frente deste século XXI.
A mulher sofrerá ainda muitas mudanças. Porém, sua essência sobreviverá nas páginas escritas por Tolstói para sempre.

(Débora Tavares)

arte: Gustav Klimt

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Massao Ohno


" Músicos, poetas, pintores, artistas, no geral e no particular, insurgi-vos! O mundo não é apenas um vasto circo de variedades, de consumo frenético. Viver é um ato prodigioso, uma dádiva a ser desfrutada, segundo a segundo, até a finitude."

Massao Ohno
(1936- 2010)

arte: Mabe

quinta-feira, 18 de novembro de 2010



Alguém já disse que é nos momentos mais importantes
que encontramo-nos irremediavelmente sozinhos.
Agora, aqui.


(Débora Tavares)


arte: Matisse

King Kong





Quando criança, não gostava do filme. Incapaz de entender a sedução do macaco-homem sobre uma mulher. Indefesa e bela, nas garras do dócil malvado.

Compreendo, hoje, que a mulher aprecia as feras.
Não pelo movimento masoquista mas pela sedução da força.
E não falo aqui de homens bem torneados. Falo da força da palavra, do gesto.
Não falo aqui de deselegância nem de grosseria, mas de firmeza.
Toda fera esconde o medo da docilidade.

Assistir a King Kong hoje, certamente seria bem diferente.

(Débora Tavares)

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Canção da manhã feliz



Luminosa manhã
Para que tanta luz?
Dá-me um pouco de céu
Mas não tanto azul
Dá-me um pouco de festa não esta
Que é demais pra os meus anseios
Ele veio manhã
Você sabe, ele veio
Despertou-me chorando
E até me beijou
Eu abri a janela
E este sol entrou
De repente em minha vida
Já tão fria e sem desejos
Estes festejos
Esta emoção

Luminosa manhã
Tanto azul tanta luz
É demais para o meu coração


(Nana Caymmi)

arte: Henri Matisse

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Sweet Norah Folk Jones




SP, 14/11/10

foto: Eneida Fontes

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Apelo


Menos vaidade,
mais amor,
que já é tarde.


arte: Theo Firmo

terça-feira, 9 de novembro de 2010

O presente


O livro não chegou em minhas mãos por acaso.
Me escolheu companheira, entre jacarandás e bibliotecas, entre fumantes e cidades.
Daquele dia em diante, talvez preenchesse uma estante. Talvez acompanhasse um abajur, um sono tardio, um espanto.

As pequenas narrações sussurraram em minhas mãos, delicadezas e vontades.
Frente a cortina entreaberta, decidi desvendá-lo.
Companheiro, eu o escolhi.


arte: Magritte

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

CONVITE-22o Encontro Brasileiro de Haicai

22o Encontro Brasileiro de Haicai
6 DE NOVEMBRO DE 2010

Associação Miyagui Kenjinkai do Brasil
Rua Fagundes, 152, Liberdade
São Paulo, Brasil
encontro@kakinet.com


Programa 12h00
Recepção ao público em geral - Início das inscrições para o Encontro

14h00
Abertura do 22o Encontro Brasileiro de Haicai

14h30
Grande Desafio - Tradicional concurso, promovido desde 1986, onde os participantes são desafiados a escrever um haicai em 20 minutos, a partir de um tema proposto na hora. Os vencedores serão conhecidos no mesmo dia.

15h30
Palestra

Haicai brasileiro: nem tradição, nem modernidade - Edson Kenji Iura


Sob todos os aspectos, o haicai é uma forma poética inventada no Brasil. Ao analisar sua evolução, o palestrante propicia um olhar diferenciado sobre o passado, o presente e o futuro, rompendo velhos paradigmas.

Edson Kenji Iura é haicaísta, membro do Grêmio Haicai Ipê, administrador do fórum eletrônico Haikai-L e colaborador do Jornal Nippo-Brasil e da revista Brasil Nikkei Bungaku.

16h10
Apresentação musical: Grupo Teclas e Flautas em Harmonia
Regência de Mitsuca Miyashita

O conjunto da cidade de São Vicente apresentará uma seleção musical especialmente elaborada para o Encontro Brasileiro de Haicai.

16h30
Premiação dos vencedores do 9o Concurso Brasileiro de Haicai Infanto-juvenil

16h45
Premiação dos vencedores do Grande Desafio

17h00
Encerramento




Outras informações

O ingresso no Encontro Brasileiro de Haicai é gratuito.

A Rua Fagundes situa-se entre as estações São Joaquim e Liberdade da Linha 1 do Metrô, fazendo travessa com a Rua Galvão Bueno e a Avenida Liberdade.

As inscrições para o Encontro devem ser feitas pessoalmente, exclusivamente no local e na data do evento, a partir das 12h00.

Crianças e adultos podem participar do Grande Desafio.

Dúvidas: encontro@kakinet.com

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Necessaire



Curioso observar o banheiro feminino da empresa: na prateleira, várias necessaire coloridas, uma ao lado da outra.
Juntas e cúmplices na vaidade. Não há receio de ter a necessaire invadida. Uma cumplicidade que pontua respeito.
Pensei na prateleira colorida de rímeis, batons, escovas e pastas de dentes, mas não parece-me ser a praticidade, o objetivo maior.
Uma necessaire confia na outra para estar ali. A que não está talvez não confie, não se integre, não se entregue.

O universo masculino é diferente: após o almoço, cada um com sua micro necessaire azul em mão. Esta fica guardada na gaveta, discreta e sozinha. E eu penso que este parágrafo, bem menor que o anterior, quer contar alguma coisa.

(Débora Tavares)


arte: Marc Chagall

sexta-feira, 15 de outubro de 2010


Diante da tristeza, qualquer detalhe é luz.

(Débora Tavares)

enxergar além...






imagem: Semeador de Estrelas - Kaunas - Lituânia

quinta-feira, 14 de outubro de 2010



(Edward Hopper)

quarta-feira, 13 de outubro de 2010




"A lógica do vento
O caos do pensamento
A paz na solidão
A órbita do tempo
A pausa do retrato
A voz da intuição
A curva do universo
A fórmula do acaso
O alcance da promessa
O salto do desejo
O agora e o infinito"

(Lenine)



arte: Edward Hopper

descobrir o equilíbrio
desequilibrar no amor para descobrir o equilíbrio
desejar paz e luz a quem se ama em qualquer situação

esvaziar a mente
encontrar Deus dentro
perdoar-se, perdoar-se






("Eat, pray, love")

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Resposta ao que se foi

Regressando do mar
não se precisa a paisagem a aportar.
O olhar sobre a areia,
agora nova ou ainda a mesma
depende da viagem.


(Débora Tavares)

O que se foi

O que se foi se foi.
Se algo ainda perdura
é só a amarga marca
na paisagem escura.

Se o que se foi regressa,
traz um erro fatal:
Falta-lhe simplesmente
ser real.

Portanto, o que se foi,
se volta é feito morte.

Então por que me faz
o coração bater tão forte?

(Ferreira Gullar)

quinta-feira, 7 de outubro de 2010


A solidão não me era companheira.
Aproximava-se sorrateira enquanto eu
mistuava-me aos livros, aos filmes,
às canções e ao sono, como quem
aguardava uma manhã menos nublada
para levantar-se e caminhar pela rua.

Ignorava eu uma solidão muito mais
funda que nem a maior alegria detém
porque independe de fatos externos.
Uma solidão que se alimenta de si,
sem fome, sem sede e com fadiga do mundo.

(Débora Tavares)



arte: Edward Hooper

porque é nas palavras mais simples que se toca o coração



He's got the whole world in His hands
(canção popular de autor desconhecido)

He's got the whole world in His hands
He's got the whole world in His hands
He's got the whole world in His hands
He's got the whole world in His hands

He's got the fish of the sea in His hands

He's got the birds of the air in His hands
He's got the fish of the sea in His hands
He's got the whole world in His hands

He's got the gamblin' man in His hands

He's got the sinner man in His hands
He's got the gamblin' man in His hands
He's got the whole world in His hands

He's got the little bitsy baby in His hands
He's got the little bitsy baby in His hands
He's got the little bitsy baby in His hands
He's got the whole world in His hands

He's got everybody here in His hands
He's got you and me, brother, in His hands
He's got everybody here in His hands
He's got the whole world...
He's got the whole world in His hands


por Nina Simone

"Just call me angel of the morning, baby
Just touch my cheek before you leave me, baby"

(Nina Simone)

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Para o Theo, que já está pra chegar.


Beautiful Boy

(John Lennon)

Close your eyes
Have no fear
The monster's gone
He's on the run and your daddy's here

Beautiful, beautiful, beautiful
Beautiful boy

Before you go to sleep
Say a little prayer
Every day in every way
It's getting better and better

Beautiful, beautiful, beautiful
Beautiful boy

Out on the ocean sailing away
I can hardly wait
To see you come of age
But I guess we'll both just have to be patient
'Cause it's a long way to go
A hard row to hoe
Yes it's a long way to go
But in the meantime
Before you cross the street
Take my hand
Life is what happens to you
While you're busy making other plans

Beautiful, beautiful, beautiful
Beautiful boy

Before you go to sleep
Say a little prayer
Every day in every way
It's getting better and better
Beautiful, beautiful, beautiful
Beautiful boy
Darling, darling, darling
Darling Sean


arte: Cândido Portinari

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Estradas



Um poeta vendeu-me seus poemas hoje na Avenida Paulista.
Perguntou-me se eu era advogada.
“Alguma coisa está fora da ordem”,pensei.


Estradas

“(...) Digo que não sei saber a vida
que levam os ladrões e as mendigas;
mas sei dum trem sem trilhos
que corrompe alguns caminhos
pondo trombas em passarinhos
e asas em andarilho.”

(Antonio Luiz Junior)




arte: Henri Matisse

Cold Cold Heart
(Norah Jones)


I’ve tried so hard my dear to show that
you're my every dream yet you're afraid
each thing I do is just some evil scheme
a memory from your lonesome past
keeps us so far apart.


Why can't I free your doubtful mind and
melt your cold,cold heart.


Another love before my time made your heart sad and blue
and so my heart is paying now for things I didn't do
in anger unkind words are said that make the
teardrops start

why can't I free your doubtful mind and
melt your cold, cold heart.

You'll never know how much it hurts to see you sit and cry
you know you need and want my love yet you're afraid to try
why do you run and hide from life to try it just ain't smart
why can't I free your doubtful mind and
melt your cold, cold heart.

There was a time when I believed that you belonged to me
but now I know your heart is shackled to a memory
the more I learn to care for you the more we drift apart
why can't I free your doubtful mind and
melt your cold, cold heart.







arte: rene Magritte

quarta-feira, 29 de setembro de 2010


" A construção poética é uma carcaça, uma fraude. Se a poesia não vem naturalmente é melhor que não venha.
Deve-se entender um poema através do sentidos.
A razão de se mergulhar num lago não é imediatamente nadar até a margem, mas sim estar no lago, deleitar-se com a sensação da água. Você não interpreta o lago, é uma experiência além do pensamento.
A poesia abranda e encoraja a alma a aceitar os mistérios"

(John Keats - poeta inglês - 1795-1820)



arte: René Magritte

para Theo


Debaixo d'água

(Arnaldo Antunes)


Debaixo d'água tudo era mais bonito, mais azul, mais colorido
só faltava respirar
mas tinha que respirar.

Debaixo d'água se formando como um feto, sereno, confortável,
amável, completo, sem chão, sem teto, sem contato com o ar,
mas tinha que respirar, todo dia.

Debaixo d'água por enquanto, sem sorriso, sem pranto, sem lamento,
sem saber o quanto esse momento poderia durar, mas tinha que respirar.

Debaixo d'água ficaria para sempre ficaria contente longe de toda
gente para sempre no fundo do mar, mas tinha que respirar, todo dia.

Debaixo d'água protegido, salvo, fora de perigo, aliviado, sem perdão
e sem pecado, sem fome, sem frio, sem medo, sem vontade de voltar,
mas tinha que respirar.

Debaixo d'água tudo era mais bonito, mais azul
mais colorido só faltava respirar, mas tinha que respirar, todo dia
todo dia, todo dia, todo dia...



arte: Gustav Klimt

quinta-feira, 23 de setembro de 2010


Enquanto houver sol
(Titãs)

Quando não houver saída
Quando não houver mais solução
Ainda há de haver saída
Nenhuma idéia vale uma vida
Quando não houver esperança
Quando não restar nem ilusão
Ainda há de haver esperança
Em cada um de nós, algo de uma criança

Enquanto houver sol,ainda haverá

Quando não houver caminho
Mesmo sem amor, sem direção
A sós ninguém está sozinho
É caminhando que se faz o caminho
Quando não houver desejo
Quando não restar nem mesmo dor
Ainda há de haver desejo
Em cada um de nós, aonde Deus colocou


arte: Amadeo Modigliani

quarta-feira, 22 de setembro de 2010


Para o que a matéria não explica,
consola-me imaginar impossibilidades:
covardia
ou amparo dos deuses.

(Débora Tavares)


arte: Edward Hooper


A beleza em cada ser é uma alegria eterna:
o seu encanto torna-se maior e nunca se há de perder
no nada; reservar-nos-á ainda um refúgio
de paz, onde adormeceremos habitados por sonhos
suaves, a felicidade do nosso corpo, uma respiração branda.
Comecemos, assim, a tecer em cada manhã
uma grinalda de flores para nos unirmos à terra,
apesar do desalento, da ausência daqueles
cuja nobreza amávamos, dos dias cheios de escuridão,
de todos os caminhos insalubres e misteriosos,
abertos para os nossos anseios; sim, apesar de tudo,
uma forma de beleza afasta o sudário
das nossas almas sombrias. Assim é o sol, a lua,
as antigas ou novas árvores cuja bênção faz germinar
a sombra sobre os humildes rebanhos; os narcisos
e o mundo verdejante que os cerca; e os límpidos rios
que para si criam um dossel de frescura
durante as estações ardentes; os silvados do bosque
enriquecidos pelo belo, nascente esplendor das rosas;
e, também, a magnificência do destino
que imaginamos para os mortos poderosos;
fs histórias encantadoras que lemos ou escutamos:
Fonte inesgotável duma imortal bebida,
que vem do limiar do céu e para nós se derrama.

E não é apenas por algumas horas passageiras
que nos abandonamos a estas essências; assim como as árvores
murmurando à volta dum templo logo se tornam
tão amadas como o próprio templo, também a lua
e a paixão da poesia, glórias infinitas, tantas vezes
nos assombram, até serem uma luz vivificadora
da alma, e com tanta firmeza nos cinjem,
para que, esteja a brilhar o sol ou se apaguem os céus,
elas existam eternamente em nós, ou morreremos

(John Keats)


arte: Claude Monet

terça-feira, 21 de setembro de 2010


"Hoje você vê a flor. Agradeça a semente de ontem"
(Haruo Ohara)


foto: Haruo Ohara - "Nuvem da manhã"

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Para Dani


Rock and roll lullaby
(Barry Mann/Cynthia Weil)

She was just sixteen
And all alone when I came to be
So we grew up together
My mama-child and me
Now things were bad and she was scared
But whenever I would cry
She’d calm my fears and dry my tears with a rock and roll lullaby

And she’d sing
Sha n ana na
It will be all right
Sha n ana na
Now just hold on tight
Sing it to me , mama
My, my, my my mama
Sing it sweet and clear
Oh Mama let me hear
That old rock and roll lullaby

Now we made it through the lonely day
But. Lord, the nights were long
And we’d dream of better mornings
When mama sang a song
Now I can’t recall the words at all
It don’t make sense to try
‘Cause I just knew lots a love came through
In that rock and roll lullaby


arte: Juan Miró

quinta-feira, 9 de setembro de 2010



ESPERO POR VOCÊ NA ABERTURA DA EXPOSIÇÃO:

DIA 14/09, À PARTIR DAS 19H30!

ATÉ LÁ

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Theo



Num mar de águas calmas ele sonha.
Para onde voa?
O que canta?
Ouve os passarinhos?
Sorri esta alegria?

Dorme esta noite um sono brando de águas, meu amor.
E eu espero o seu amanhecer.



arte: Miró

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Alegrias

Meu poema Anzol foi finalista do Prêmio Off FLIP de Literatura 2010 e fará parte de uma antologia.


ANZOL

Meu pai não teve filho.
Meu pai aos quatro anos não teve mais pai.
Meu filho de quatro anos senta a seu lado.
Eles pescam a companhia que faltava.

segunda-feira, 5 de julho de 2010


“A menor distância entre o homem e Deus é o próximo" (Manoel Affonso de Mello)

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Outono


Uma rua estreita, um túnel de árvores, uma chuva de folhas.
Uma lua, uma canção. Simplesmente.


Simplesmente posso esperar
Aqui por você
Uma eternidade, uma tarde inteira
Simplesmente posso encontrar
Qualquer distração
Ruas da cidade, restos de uma feira

Eu tomo um atalho lá, só pra te perder
Enquanto olho os aviões
Nada tremeu no ar, não vi nenhum sinal
Simplesmente posso esperar

Simplesmente posso esquecer
Da guerra ou da paz
Uma eternidade, uma tarde inteira
Calmamente posso contar
As nuvens do céu
Rostos na vidraça, flores dessa praça

Desço a Consolação só pra coincidir
Leio manchetes por aí
Nada tremeu no ar, não vi nenhum sinal
Mesmo assim posso esperar

Até deixar um recado na tarde
Uma simples saudade
Que você vai sentir
Quando sentar-se à mesa
Uma simples certeza
Que agora é você quem espera por mim


(Pedro Mariano)

domingo, 27 de junho de 2010

Inverno



No dia em que fui mais feliz
Eu vi um avião
Se espelhar no seu olhar até sumir
De lá pra cá não sei
Caminho ao longo do canal
Faço longas cartas pra ninguém
E o inverno no Leblon é quase glacial

Há algo que jamais se esclareceu
Onde foi exatamente que larguei
Naquele dia mesmo
O leão que sempre cavalguei

Lá mesmo esqueci que o destino
Sempre me quis só
No deserto sem saudade, sem remorso só
Sem amarras, barco embriagado ao mar
Não sei o que em mim
Só quer me lembrar
Que um dia o céu reuniu-se à terra um instante por nós dois
Pouco antes de o ocidente se assombrar


Composição: Adriana Calcanhoto/Antonio Cícero

sexta-feira, 25 de junho de 2010

A moça tecelã



Por Marina Colasanti

Acordava ainda no escuro, como se ouvisse o sol chegando atrás das beiradas da noite. E logo sentava-se ao tear.

Linha clara, para começar o dia. Delicado traço cor da luz, que ela ia passando entre os fios estendidos, enquanto lá fora a claridade da manhã desenhava o horizonte.
Depois lãs mais vivas, quentes lãs iam tecendo hora a hora, em longo tapete que nunca acabava.

Se era forte demais o sol, e no jardim pendiam as pétalas, a moça colocava na lançadeira grossos fios cinzentos do algodão mais felpudo. Em breve, na penumbra trazida pelas nuvens, escolhia um fio de prata, que em pontos longos rebordava sobre o tecido. Leve, a chuva vinha cumprimentá-la à janela.

Mas se durante muitos dias o vento e o frio brigavam com as folhas e espantavam os pássaros, bastava a moça tecer com seus belos fios dourados, para que o sol voltasse a acalmar a natureza.

Assim, jogando a lançadeira de um lado para outro e batendo os grandes pentes do tear para frente e para trás, a moça passava os seus dias.

Nada lhe faltava. Na hora da fome tecia um lindo peixe, com cuidado de escamas. E eis que o peixe estava na mesa, pronto para ser comido. Se sede vinha, suave era a lã cor de leite que entremeava o tapete. E à noite, depois de lançar seu fio de escuridão, dormia tranqüila.

Tecer era tudo o que fazia. Tecer era tudo o que queria fazer.

Mas tecendo e tecendo, ela própria trouxe o tempo em que se sentiu sozinha, e pela primeira vez pensou em como seria bom ter um marido ao lado.

Não esperou o dia seguinte. Com capricho de quem tenta uma coisa nunca conhecida, começou a entremear no tapete as lãs e as cores que lhe dariam companhia. E aos poucos seu desejo foi aparecendo, chapéu emplumado, rosto barbado, corpo aprumado, sapato engraxado. Estava justamente acabando de entremear o último fio da ponto dos sapatos, quando bateram à porta.

Nem precisou abrir. O moço meteu a mão na maçaneta, tirou o chapéu de pluma, e foi entrando em sua vida.

Aquela noite, deitada no ombro dele, a moça pensou nos lindos filhos que teceria para aumentar ainda mais a sua felicidade.

E feliz foi, durante algum tempo. Mas se o homem tinha pensado em filhos, logo os esqueceu. Porque tinha descoberto o poder do tear, em nada mais pensou a não ser nas coisas todas que ele poderia lhe dar.

— Uma casa melhor é necessária — disse para a mulher. E parecia justo, agora que eram dois. Exigiu que escolhesse as mais belas lãs cor de tijolo, fios verdes para os batentes, e pressa para a casa acontecer.

Mas pronta a casa, já não lhe pareceu suficiente.

— Para que ter casa, se podemos ter palácio? — perguntou. Sem querer resposta imediatamente ordenou que fosse de pedra com arremates em prata.


Dias e dias, semanas e meses trabalhou a moça tecendo tetos e portas, e pátios e escadas, e salas e poços. A neve caía lá fora, e ela não tinha tempo para chamar o sol. A noite chegava, e ela não tinha tempo para arrematar o dia. Tecia e entristecia, enquanto sem parar batiam os pentes acompanhando o ritmo da lançadeira.

Afinal o palácio ficou pronto. E entre tantos cômodos, o marido escolheu para ela e seu tear o mais alto quarto da mais alta torre.

— É para que ninguém saiba do tapete — ele disse. E antes de trancar a porta à chave, advertiu: — Faltam as estrebarias. E não se esqueça dos cavalos!

Sem descanso tecia a mulher os caprichos do marido, enchendo o palácio de luxos, os cofres de moedas, as salas de criados. Tecer era tudo o que fazia. Tecer era tudo o que queria fazer.

E tecendo, ela própria trouxe o tempo em que sua tristeza lhe pareceu maior que o palácio com todos os seus tesouros. E pela primeira vez pensou em como seria bom estar sozinha de novo.

Só esperou anoitecer. Levantou-se enquanto o marido dormia sonhando com novas exigências. E descalça, para não fazer barulho, subiu a longa escada da torre, sentou-se ao tear.
Desta vez não precisou escolher linha nenhuma. Segurou a lançadeira ao contrário, e jogando-a veloz de um lado para o outro, começou a desfazer seu tecido. Desteceu os cavalos, as carruagens, as estrebarias, os jardins. Depois desteceu os criados e o palácio e todas as maravilhas que continha. E novamente se viu na sua casa pequena e sorriu para o jardim além da janela.
A noite acabava quando o marido estranhando a cama dura, acordou, e, espantado, olhou em volta. Não teve tempo de se levantar. Ela já desfazia o desenho escuro dos sapatos, e ele viu seus pés desaparecendo, sumindo as pernas. Rápido, o nada subiu-lhe pelo corpo, tomou o peito aprumado, o emplumado chapéu.
Então, como se ouvisse a chegada do sol, a moça escolheu uma linha clara. E foi passando-a devagar entre os fios, delicado traço de luz, que a manhã repetiu na linha do horizonte.



arte: Ana Peluso

And the radio sings this song. The first of the day.




Beautiful Girl


Nicky's in the corner
With a black coat on
Running from a bad home
With some cat inside

Now where did you find her
Among the neon lights
That haunt the streets outside
She says
Stay with me

Beautiful girl
Stay with me
Beautiful girl
Stay with me
She wants to go home

From doorway to doorway
Street corner to corner
With the neon ghosts in the city
And she says

Stay with me


She's so scared
So very frightened
Anything could happen
Right here tonight

Beautiful girl
Stay with me



song: Andrew Farris by Paulo Ricardo
art: Paul Klee

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Um minuto



Eles estavam do lado oposto da calçada. Ela falava com as mãos e o rosto aflitos. Ele a ouvia serenamente, pelo que sinalizava seu corpo imóvel, de costas para mim. Ela aquietou-se e baixou a cabeça. Ele acolheu seu rosto com uma das mãos. Abraçaram-se. Desfeito o abraço, olhos nos olhos e mãos dadas, ela beijou-lhe as mãos (pouco existe de mais terno do que um beijo nas mãos). Ela partiu tranquila. Ele acompanhou-a por trás dos óculos que agora eu via. Ele acenou com a mão, para ela, a alegria da paz. E um nascer de saudade.


arte: Camille Claudel

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Agridoce


não pensemos em nada
não planejemos
não sejamos rígidos
mas rijos e depois suaves...



arte: Gustav Klimt

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Pequenas Epifanias


Há alguns dias, Deus — ou isso que chamamos assim, tão
descuidadamente, de Deus —, enviou-me certo presente ambíguo: uma possibilidade de amor. Ou disso que chamamos, também com descuido e alguma pressa, de amor. E você sabe a que me refiro.

Antes que pudesse me assustar e, depois do susto, hesitar entre ir ou não ir, querer ou não querer — eu já estava lá dentro. E estar dentro daquilo era bom. Não me entenda mal — não aconteceu qualquer intimidade dessas que você certamente imagina. Na verdade, não aconteceu quase nada. Dois ou três almoços, uns silêncios. Fragmentos disso que chamamos, com aquele mesmo descuido, de "minha vida". Outros fragmentos, daquela "outra vida". De repente cruzadas ali, por puro mistério, sobre as toalhas brancas e os copos de vinho ou água, entre casquinhas de pão e cinzeiros cheios que os garçons rapidamente esvaziavam para que nos sentíssemos limpos. E nos sentíamos.

Por trás do que acontecia, eu redescobria magias sem susto algum. E de repente me sentia protegido, você sabe como: a vida toda, esses pedacinhos desconexos, se armavam de outro jeito, fazendo sentido. Nada de mal me aconteceria, tinha certeza, enquanto estivesse dentro do campo magnético daquela outra pessoa. Os olhos da outra pessoa me olhavam e me reconheciam como outra pessoa, e suavemente faziam perguntas, investigavam terrenos: ah você não come açúcar, ah você não bebe uísque, ah você é do signo de Libra. Traçando esboços, os dois. Tateando traços difusos, vagas promessas.

Nunca mais sair do centro daquele espaço para as duras ruas anônimas. Nunca mais sair daquele colo quente que é ter uma face para outra pessoa que também tem uma face para você, no meio da tralha desimportante e sem rosto de cada dia atravancando o coração. Mas no quarto, quinto dia, um trecho obsessivo do conto de Clarice Lispector "Tentação" na cabeça estonteada de encanto: "Mas ambos estavam comprometidos. Ele, com sua natureza aprisionada. Ela, com sua infância impossível". Cito de memória, não sei se correto. Fala no encontro de uma menina ruiva, sentada num degrau às três da tarde, com um cão basset também ruivo, que passa acorrentado. Ele pára. Os dois se olham. Cintilam, prometidos. A dona o puxa. Ele se vai. E nada acontece.

De mais a mais, eu não queria. Seria preciso forjar climas, insinuar convites, servir vinhos, acender velas, fazer caras. Para talvez ouvir não. A não ser que soprasse tanto vento que velejasse por si. Não velejou. Além disso, sem perceber, eu estava dentro da aprendizagem solitária do não-pedir. Só compreendi dias depois, quando um amigo me falou — descuidado, também — em pequenas epifanias. Miudinhas, quase pífias revelações de Deus feito jóias encravadas no dia-a-dia.

Era isso — aquela outra vida, inesperadamente misturada à minha, olhando a minha opaca vida com os mesmos olhos atentos com que eu a olhava: uma pequena epifania. Em seguida vieram o tempo, a distância, a poeira soprando. Mas eu trouxe de lá a memória de qualquer coisa macia que tem me alimentado nestes dias seguintes de ausência e fome. Sobretudo à noite, aos domingos. Recuperei um jeito de fumar olhando para trás das janelas, vendo o que ninguém veria.

Atrás das janelas, retomo esse momento de mel e sangue que Deus colocou tão rápido, e com tanta delicadeza, frente aos meus olhos há tanto tempo incapazes de ver: uma possibilidade de amor. Curvo a cabeça, agradecido. E se estendo a mão, no meio da poeira de dentro de mim, posso tocar também em outra coisa. Essa pequena epifania. Com corpo e face. Que reponho devagar, traço a traço, quando estou só e tenho medo. Sorrio, então. E quase paro de sentir fome.


(Caio Fernando de Abreu)


arte: Marc Chagall

domingo, 6 de junho de 2010

Todo sentimento



Todo Sentimento


Preciso não dormir
Até se consumar
O tempo da gente
Preciso conduzir
Um tempo de te amar
Te amando devagar e urgentemente
Pretendo descobrir
No último momento
Um tempo que refaz o que desfez
Que recolhe todo sentimento
E bota no corpo uma outra vez

Prometo te querer
Até o amor cair
Doente, doente
Prefiro então partir
A tempo de poder
A gente se desvencilhar da gente
Depois de te perder
Te encontro com certeza
Talvez num tempo da delicadeza
Onde não diremos nada
Nada aconteceu
Apenas seguirei
Como encantado ao lado teu





composição: Chico Buarque
arte: Marc Chagall

domingo, 30 de maio de 2010

Por onde?



(Kléber Albuquerque/Tata Fernandes)


Por onde passará o amor se a ponte quebrar?
Será que vai por água abaixo ou aprende a voar?

Se vai voar até o infinito
Se esquecer de continuar
Ou vai fincar o pé na margem e acenar
Para um ponto qualquer no horizonte
Ou vai descer o rio até chegar no mar
Ou se o amor é a própria ponte
Amor, me diga
Ai, amor, me conte

Por onde passará o amor se a ponte quebrar?
Será que vai por água abaixo ou aprende a voar?

Se vai pagar pra ver a flor do abismo desabrochar
Ou vai se consumir até se consumar
Ou vai cair em si até o último andar
Saí sem ter paradeiro nem hora pra chegar
Vou conhecer o mundo inteiro e se você chamar
Com meu cavalo ligeiro volto pra te buscar

Por onde passará o amor
Se a ponte quebrar?
Por onde passará o amor
Se a ponte quebrar?





arte: Marc Chagall

terça-feira, 25 de maio de 2010

O indizível


A palavra nem tudo pode dizer.
Aprendo o significado do indizível.

Tudo que arrebata indizível é:
Tristeza. Amor. Alegria.



arte: Gustav Klimt

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Concrete jungle





I wish I could be free from this "Concrete jungle".
At least for today.




Concrete Jungle

Composição: Bob Marley


No sun will shine in my day today
The high yellow moon won't come out to play
Darkness has covered my light
And has changed my day into night
Now where is this love to be found, won't someone tell me?
'Cause life, sweet life, must be somewhere to be found, yeah
Instead of a concrete jungle where the livin' is hardest
Concrete jungle, oh man, you've got to do your best, yeah.

No chains around my feet, but I'm not free
I know I am bound here in captivity
And I've never known happiness, and I've never known sweetcaresses
Still, I be always laughing like a clown
Won't someone help me?
Cause, sweet life, I've, I've got to pick myself from off theground, yeah
In this here concrete jungle,
I say, what do you got for me now?
Concrete jungle, oh, why won't you let me be now?

I said life must be somewhere to be found
Instead of a concrete jungle, illusion, confusion
Concreate jungle
Concrete jungle, you name it, we got it, concrete jungle now

terça-feira, 18 de maio de 2010

Andei pensando


Ouvi dizer que poesia não compra sapato.
Mas como viver sem poesia?

Andei pensando
Pra que parar pra pensar
Se é possível pensar andando?


(Sérgio Molina / Tata Fernandes)

arte: Kandinski

domingo, 16 de maio de 2010

Com desenfreado afeto


Tomo para mim as dores do mundo. Não assisto mais a noticiários, não me habituo a tragédias. Não que eu seja tão sensível ou tão altruísta. Talvez eu ainda não tenha aprendido a separar-me do outro.

Diante da dor de um familiar eu abraço a causa com raiva e afeto. Eu me incomodo, tomo partido. Sei que a imparcialidade não dói mas minha paixão tem partido,levanta a bandeira da torcida, não fica no banco reserva.

Ainda não aprendi a ser metade. Ainda não aprendi a ser o inteiro, isolado.
Tento me adestrar ao que me poderia ser mais confortável e eliminar as olheiras da noite mal dormida.

Creio tanto no outro que me esfacelo em tantos pedaços quanto a suposta altura daquele que me fiz acreditar. Minha crença precisa aprender a crer.

Quem sabe um dia eu possa ouvir em silêncio. O silêncio maduro do não comprometimento. Quem sabe eu possa ligar a televisão com a distância necessária. Quisera um dia não mais precisar da distância.




arte: Salvador Dali

sexta-feira, 14 de maio de 2010


Vilarejo

Há um vilarejo ali
Onde areja um vento bom
Na varanda, quem descansa
Vê o horizonte deitar no chão

Pra acalmar o coração
Lá o mundo tem razão
Terra de heróis, lares de mãe
Paraíso se mudou para lá

Por cima das casas, cal
Frutas em qualquer quintal
Peitos fartos, filhos fortes
Sonho semeando o mundo real

Toda gente cabe lá
Palestina, Shangri-lá
Vem andar e voa...

Lá o tempo espera
Lá é primavera
Portas e janelas ficam sempre abertas
Pra sorte entrar

Em todas as mesas, pão
Flores enfeitando
Os caminhos, os vestidos, os destinos
E essa canção

Tem um verdadeiro amor
Para quando você for


Composição: Marisa Monte, Pedro Baby, Carlinhos Brown e Arnaldo Antunes

arte sumi-ê

quarta-feira, 12 de maio de 2010




A hora da partida

(Sophia de Mello Breyner Andresen)


A hora da partida soa quando

escurece o jardim e o vento passa.

Estala o chão e as portas batem, quando

a noite cada nó em si deslaça.

A hora da partida soa quando

as árvores parecem inspiradas.

Como se tudo nelas germinasse.

Soa quando no fundo dos espelhos

me é estranha e longínqua a minha face

e de mim se desprende a minha vida.

terça-feira, 11 de maio de 2010


Se queres ser universal, começa por pintar a tua aldeia.
(Liev Tolstoi)

segunda-feira, 10 de maio de 2010

haicai



Fim de outono
Árvore de uma flor
No canteiro central




por Débora Tavares

arte: Auguste Macke